Portugal // O jogo sujo contra os estivadores do Porto de Setúbal~ 4 min

Dockers of the port of Setúbal displaying banner against precarious work in the port.
Imagem via “O Estivador”, blogue do SEAL.

Por Duarte Guerreiro

O Sindicato dos Estivadores e da Actividade Logística (SEAL) tem sido nos últimos anos um exemplo no combate à precariedade em Portugal. Um sindicato que faz da solidariedade, apoio mútuo e combatividade a sua principal bandeira.

Em greve há mais de 3 meses

Mais de 700 estivadores dos 8 portos portugueses onde o SEAL está representado (Leixões, Figueira da Foz, Lisboa, Setúbal, Sines, Caniçal, Ponta Delgada e Praia da Vitória) encontram-se em greve ao trabalho suplementar há mais de 3 meses. As razões da greveaqui foram resumidas aquando da última manifestação do SEAL, relacionando-se com o combate à precariedade e as práticas anti-sindicais dos patrões.

A luta dos “eventuais” do Porto de Setúbal

Desde o início desta luta que o SEAL tem verificado graves violações à legislação que regulamenta as greves, com principal incidência no Porto de Setúbal. A pressão exercida pela entidade patronal sobre os trabalhadores “eventuais” deste porto tem vindo a aumentar nos últimos tempos. Os chamados “eventuais” – trabalhadores com contratos diários – compõem 90% dos trabalhadores que asseguram o funcionamento do porto.

Estes trabalhadores carecem de qualquer tipo de direito laboral, tais como subsídios de férias e de Natal, dias de descanso ou até direito à protecção social em caso de doença ou acidente de trabalho. Ou seja, estes operários são admitidos e despedidos 2 vezes por dia. Existem estivadores neste tipo de condições há mais de 20 anos.

Há algumas semanas atrás, alguns trabalhadores “eventuais” de Setúbal pararam as operações, no respeito pelo pré-aviso de greve emitido pelo SEAL.

Dias mais tarde esses mesmos 28 estivadores em greve foram notificados para assinarem uma carta de despedimento. “Face a esta ameaça, todos os trabalhadores eventuais ameaçaram parar e as empresas recuaram e anularam essas intenções de despedimento colectivo encapotado.”

De seguida, a empresa de trabalho portuário Operestiva – com as operadoras portuárias Sadoport e Naviport, relacionadas – mantiveram a pressão sobre os trabalhadores, com um processo contínuo de cartas de aliciamento com propostas individuais, o que o SEAL considerou ser “uma tentativa de divisão dos trabalhadores”. Algo que ocorreu “em tempos de greve, o que é ilegal face à legislação portuguesa”, acrescenta o sindicato.

Foi esta situação intolerável que levou os estivadores a decretarem paralisação completa do movimento de cargas e descargas no terminal de contentores e automóveis em Setúbal.

Os trabalhadores recusam-se a trabalhar, enquanto a entidade empregadora – a empresa Operestiva – não assinar contratos de trabalho permanentes com todos os precários.

“A Associação dos Agentes de Navegação de Portugal, em defesa das empresas, queixa-se de que não houve nenhum pré-aviso de greve. E os trabalhadores responderam que se são precários não têm direitos, pelo que também não têm o dever de anunciar as paralisações. ‘Como só ganhamos quando há trabalho, também só trabalhamos quando queremos’, defendem.”

Meios de comunicação – do silêncio à defesa do patrão

Apesar de esta luta laboral estar a decorrer há mais de 8 meses, envolvendo centenas de trabalhadores espalhados por 8 portos nacionais, parece que apenas ontem os meios de comunicação se deram conta da sua existência.

Salvo algumas excepções, na maioria dos casos dava-se um maior relevo ao alegado impacto da greve nas exportações da Volkswagen Autoeuropa – desde o início da paralisação cerca de 22 navios já foram mandados para trás e outros 13 encontram-se em risco esta semana – mencionando apenas ao de leve a situação precária dos estivadores. Entretanto, os próprios trabalhadores da Volkswagen Autoeuropa declararam a sua total solidariedade com a luta dos estivadores, mesmo que isso prejudique os seus objectivos de produção.

SEAL ameaça com paralisação completa

O SEAL alerta que chegou a ser colocada ontem a hipótese de trazer trabalhadores temporários do Porto de Lisboa para suprimir a ausência dos estivadores do Porto de Setúbal. Mas os “estivadores de Lisboa, fiéis aos seus princípios, recusaram trair a luta que outros estivadores estão a travar”, como podemos ler no comunicado que saiu esta madrugada.

Vendo que a primeira tentativa saiu fracassada, a entidade empregadora começou ontem à noite a aliciar trabalhadores do Porto de Aveiro para trabalharem em Setúbal. O director técnico executivo e vogal da direcção da GPA – Empresa de Trabalho Portuário de Aveiro – Fernando Curval, enviou um SMS a todos os trabalhadores. Este convocava-os a trabalharem ilegalmente durante 3 dias, “sendo ‘carregados’ durante 300 quilómetros, com direito a dormida em cama estranha, a serem pagos por verba surpresa ‘a informar atempadamente’, vergonhosamente escoltados por forças de segurança, requerida superiormente.”

O SEAL ameaça agora paralisar totalmente as operações no Porto de Setúbal, “em resultado da anunciada colocação de trabalhadores oriundos do porto de Aveiro.”

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