Não é o Hamas que impede a paz – resposta a Francisco Louçã~ 3 min

Por Paulo Salah Ad Din

O Hamas é inimigo do povo palestiniano. Prejudica, impede e não contribui para uma paz.

Francisco Louçã numa entrevista asquerosa à SIC Notícias a 7 de Outubro de 2025

Essa frase — repetida com solenidade burocrática em parlamentos e editoriais ocidentais — não é uma análise: é um briefing de propaganda, cuidadosamente embalado e distribuído por quem teme que o oprimido ainda tenha voz.

O enredo é simples: Israel bombardeia, confisca, bloqueia e assassina. O mundo, com um ar de superioridade moral, exige moderação dos que sobrevivem. Quando os sobreviventes reagem, o script muda — passam a ser “inimigos da paz”.

O Hamas não nasceu do nada, nem é uma aberração política espontânea. É o produto direto da ocupação, da humilhação e do apartheid. É a forma — imperfeita, dura, inevitável — de uma resistência forjada sob ruínas. Achar que um povo cercado e massacrado pedirá liberdade com flores é delírio colonial.

O regime sionista teme menos os foguetes do que a legitimidade da resistência. Teme o símbolo de um povo que ainda não se dobrou à paz do cativeiro. Por isso financia e encomenda frases como essa — pequenas cápsulas de anestesia moral para que o Ocidente durma em paz enquanto Gaza arde.

Não é o Hamas que impede a paz. É o ocupante que não aceita o fim da sua própria violência. A paz que nos vendem é o silêncio do oprimido. E alguns, como Francisco Louçã, confundem esse silêncio com civilização. Foi dito pelos palestinianos: “respeitem minha existência ou experimentem minha resistência.”  Ainda teremos de manter a resistência — dentro e fora de Gaza — porque a ocupação não terminou, apenas mudou de rosto. A Cisjordânia, fatiada por colônias ilegais e cercada por postos militares, tornou-se um arquipélago de vilas sitiadas. Nenhum povo pode construir futuro enquanto vive sob torres de vigilância e leis impostas por quem o coloniza.

A libertação palestina não é uma metáfora distante, é uma urgência concreta: recuperar territórios, expulsar milícias sionistas e garantir que o solo palestino volte a servir ao seu povo — e não às empresas de segurança e assentamentos armados que o exploram.

Mesmo se a partilha fosse honesta (e nunca foi), restaria menos da metade do território original. E, ainda assim, essa metade bastaria para um país viável — fértil, produtivo, autônomo. O que impede isso não é a falta de diálogo, é a falta de justiça.

Mas, mesmo num cenário de recuperação territorial, ainda restará a ferida da descontinuidade: Gaza e Cisjordânia permanecem isoladas uma da outra, separadas por muros, desertos e checkpoints. Essa fragmentação torna tudo mais vulnerável e continuará a expor os palestinos à humilhação diária dos postos de controle — a lembrança constante de que não há soberania sem continuidade territorial.

A resistência, portanto, não é uma escolha romântica, mas um ato de sobrevivência. Enquanto um soldado estrangeiro patrulhar as ruas de Hebron, enquanto um colono armado decidir quem pode plantar uma oliveira ou atravessar uma estrada, a paz será apenas um discurso hipócrita.

Resistir, enfim, é continuar existindo. E existir, para o povo palestino, é o mais radical dos atos de liberdade.

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