Um ano sem Yahya Sinwar~ 8 min

Por Francisco Ulrike

Ontem cumpriu-se um ano desde que Yahya Sinwar caiu em combate contra as forças da ocupação. Estratega exímio, combatente, filósofo, poeta e líder da resistência em Gaza, Sinwar conquistou um lugar especial no épico do povo palestiniano rumo à libertação.

Sinwar nasceu em 1962 no campo de refugiados de Khan Younis, filho de pais expulsos de Asqalan (Ashkelon) durante a Nakba de 1948.

Sinwar foi preso pela primeira vez em 1982, quando tinha apenas 19 anos, por “actividades islâmicas”. Em 1987, durante a Primeira Intifada, foi um dos membros fundadores do Hamas. Ao todo, passou 23 anos nas prisões da ocupação.

Desde a prisão, fez parte das negociações que culminaram na libertação de 1024 palestinianos em troca de Gilad Shalit, um soldado israelita capturado 5 anos antes pela resistência palestiniana em Gaza. Ao sair, Sinwar prometeu libertar os milhares de palestinianos que permaneciam nas cadeias de israel.

Sinwar regressa a Gaza, Outubro de 2011

Eleito líder do Hamas em Gaza em 2017, esteve por detrás do planeamento da Inundação de Al Aqsa, que tem como um dos objectivos a libertação dos milhares de prisioneiros mantidos em cativeiro pelo regime sionista. Em Agosto de 2024, substitiu Haniyeh como líder geral do movimento depois do seu assassinato em Teerão. 

Aos 62 anos de idade, morreu de arma na mão a confrontar a ocupação.

A derradeira batalha de Yahya Sinwar

Ao contrário do que a propaganda israelita afirmava, Sinwar não estava escondido nos túneis de Gaza, nem estava rodeado por reféns, razão invocada pelas forças israelitas para não o terem assassinado – apesar de, alegadamente, conhecerem o seu paradeiro. 

A verdade é que Yahya Sinwar combateu até ao último momento pela libertação do seu povo.

Após um ano de genocídio, Sinwar não foi morto num bombardeamento ou num assassinato selectivo, mas num confronto acidental – e o seu corpo foi encontrado por pura coincidência.

A sua derradeira batalha teve lugar em Tel al-Sultan, em Rafah. Mesmo após todos os seus companheiros terem sido mortos durante um confronto com as forças da ocupação, Sinwar não desistiu – levando o inimigo a pedir reforços aéreos e tanques.

Após a sua morte, o regime sionista decidiu publicar as imagens captadas por um dos seus drones, pensando que isso o humilharia, mostrando-o como fraco nos seus momentos finais – em vez disso, as imagens imortalizaram-no. Mostraram que – mesmo após ter ficado sozinho, com um braço incapacitado e sem armas – Sinwar resistiu até ao fim, pegando num pedaço de madeira e atirando-o contra o drone sionista num último acto de desafio e insubmissão.

Estas imagens imortalizaram-no como um símbolo da resistência palestiniana à ocupação, ao apartheid e ao genocídio – que viverá para sempre.

Três meses depois, em Janeiro deste ano, um documentário da Al Jazeera revelou imagens inéditas de Yahya Sinwar a dirigir operações confra as forças da ocupação em Rafah e a caminhar entre os escombros na linha da frente, em alguns casos a apenas algumas dezenas de metros de forças israelitas – deitando por terra de forma definitiva a narrativa israelita de que Sinwar estava escondido nos túneis, rodeado de todo o tipo de luxos, enquanto o seu povo enfrentava o genocídio.

Sinwar homenageado em Atenas

O primeiro aniversário da morte de Sinwar foi assinalado ontem em Atenas. A “Vigília pelo mártir revolucionário Yahya Sinwar”, que deveria ter tido lugar em Syntagma, foi proibida pelas autoridades gregas, que mobilizaram centenas de polícias para a praça em frente ao parlamento grego.

A vigília acabou por se realizar no coração do bairro de Exarcheia, no local onde Alexandros Grigoropoulos foi assassinado pela polícia em 2008.

Fotos de Gather4Gaza e Dominic Leontas

Durante a vigília, foi lido um comunicado do colectivo do Gather 4 Gaza, que aqui traduzimos na íntegra:

Comandante revolucionário anticolonial. Estratega da operação Inundação de Al-Aqsa. Líder do Gabinete Político da Resistência Islâmica [Hamas]. Heróico mujahid. Filósofo e poeta poliglota da Resistência. Pai dos Mártires.

Yahya Sinwar, Abu Ibrahim, nascido em Khan Younis a 29 de Outubro de 1962, uma década após a Nakba que expulsou a sua família de Asqalan, foi morto em combate na Batalha de Rafah faz hoje um ano, resistindo à ocupação até ao último suspiro, na mais magnífica proeza militar do século XXI — se não da história.

O facto de uma força tão pequena, faminta e órfã, com armas produzidas localmente sob um cerco total, ter resistido nesta batalha contra uma superpotência nuclear e o poder combinado do Ocidente é uma prova do espírito indomável e da determinação do povo palestiniano, bem como da brilhante liderança de Yahya Sinwar.

O mártir Sinwar não se escondeu em nenhum complexo ou gabinete a dirigir a batalha à distância, como afirmam os sionistas e os seus servos, mas lutou lado a lado com as suas tropas na linha da frente, levando a tocha revolucionária dos líderes anticoloniais que lideraram de espingarda na mão e recusaram render-se, de Omar Mukhtar, Sheikh Izz Al Din Al Qassam e Dalal Mughrabi, a Che Guevara, Ali La Pointe, Amílcar Cabral e Chris Hani. 

O facto de a ocupação ainda permanecer, de a ocupação continuar o seu projecto exterminador na região sob a fachada dos chamados «cessar-fogos», não é um fracasso do Hamas, nem do colectivo da Resistência palestiniana, nem dos nossos aliados no Iémen, Líbano e Irão, mas um fracasso nosso, aqui no Ocidente, que não conseguimos desmantelar o imperialismo nas suas raízes ensopadas em sangue – nem nos empenhámos numa solidariedade material activa com a Resistência, nesta batalha contra o Império e os seus colaboradores.

Concluímos com citações da última vontade do Comandante Mártir Yahya Sinwar:

«Não temam a prisão, pois ela é um passo na longa e desafiante jornada rumo à liberdade. Essa liberdade não é apenas um direito roubado, mas um conceito nascido da dor e moldado pela arma da paciência.
Essa luta não é uma fase passageira, mas o nosso destino levado adiante até a última gota do nosso sangue.»

«A minha vontade é que permaneçam firmes, agarrando-se à vossa dignidade e ao sonho que nunca morre. O inimigo quer que abandonemos a resistência, que transformemos a nossa causa em negociações intermináveis, mas eu digo-vos: não negociem aquilo que é vosso por direito.
Levem o sonho da Palestina no vosso coração e transformem cada ferida numa arma e cada lágrima numa fonte de esperança.»

«Esta é a minha vontade: Não larguem as vossas armas. Não deitem fora as vossas pedras. Não se esqueçam dos vossos mártires e não façam cedências num sonho que é legitimamente vosso.
Se eu cair, não caiam comigo, mantenham erguida a bandeira que nunca cai e façam do meu sangue uma ponte para uma geração que, das nossas cinzas, renasça mais forte.»

Glória ao eterno herói Yahya Sinwar.

Glória a todos os mártires da luta contra o sionismo e o imperialismo.

Morte à ocupação, morte ao imperialismo, morte ao regime colaboracionista grego!

Vitória à resistência.

Atenas, 16 de Outubro de 2025

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