Meta remove conta da Guilhotina no instagram~ 8 min

Por Guilhotina.info
Durante as últimas semanas, cerca de uma dezena de publicações e stories nossas foram removidas pelo instagram. Fomos proibidos de fazer colaborações com outras contas, e o alcance das nossas publicações e stories foi limitado. Anteontem, os censores da Meta decidiram mandar abaixo a nossa página no instagram, que conta com quase 10 mil seguidores.
Não recebemos este derradeiro castigo com qualquer surpresa – se há algo que nos surpreende é não ter acontecido mais cedo. Afinal, ao longo dos últimos dois anos, a Meta censurou mais de 40 milhões de publicações pró-Palestina e apagou inúmeras contas de jornalistas e organizações palestinianas ou pró-Palestina. E esta censura abate-se de forma especialmente pesada sobre as vozes que apoiam abertamente o direito do povo palestiniano (e de outros povos) a resistir – por todos os meios – à barbárie do Império.
Porém, meras 48 horas após a conta ser removida, e poucos minutos depois de termos submetido um recurso, recebemos inesperadamente a nossa página de volta, e todo o conteúdo não censurado foi restaurado. Contudo, nada garante que não decidam, mais tarde ou mais cedo, banir definitivamente a página – pelo que preparámos uma conta backup.
Inteligência artificial e censura automatizada
A notificação que recebemos do instagram sobre a remoção da conta, como habitual, oferecia poucas explicações. No entanto, na categoria «como tomámos esta decisão», podia ler-se: «a nossa tecnologia descobriu que a vossa conta, ou actividade nela, não segue as nossas regras».
Ou seja, não foi um funcionário da Meta que identificou as “violações” cometidas – foi «a nossa tecnologia».


Não é de agora que se sabe que a Meta usa ferramentas automáticas para remover conteúdos. Em Abril deste ano, uma investigação da Drop Site News revelou que, durante o genocídio em curso na Faixa de Gaza, «a Meta expandiu significativamente as remoções automáticas (…), resultando em cerca de 38,8 milhões de publicações adicionais terem sido alvo de acções [removidas, banidas ou suprimidas] no Facebook e no Instagram desde finais de 2023», criando assim «o que pode ser considerado a maior operação de censura em massa da História moderna».
A investigação da Drop Site News revelou ainda que «a moderação automatizada removeu frequentemente conteúdos pró-palestinianos que não violavam as políticas da Meta». E esta campanha de censura em massa é um modelo para o futuro:
O programa de Inteligência Artificial que a Meta está actualmente a desenvolver para moderar conteúdos baseará as suas decisões na remoção bem-sucedida de conteúdos críticos do genocídio perpetrado pelo regime sionista.
Drop Site News, Abril de 2025
A modernidade tirou as massas das ruas e atirou-as para a internet e para as redes sociais, vendendo a imagem de uma “internet livre” onde supostamente se concretizaria a manifestação derradeira da liberdade de expressão. Agora, os algoritmos marginalizam as vozes incómodas, e os mesmos mecanismos usados para remover automaticamente conteúdos de pornografia e violência extrema são usados para remover automaticamente opiniões políticas indesejadas.
A censura sistemática da solidariedade com a Palestina nas paredes de várias cidades portuguesas (exemplos: Lisboa, Leiria, Coimbra) replica-se nas redes sociais – que substituíram os cafés, as associações e as praças como os principais espaços de discussão política, e suplantaram os jornais e televisões como principal fonte de informação da maioria da população.
Enquanto a atenção se foca na extrema-direita, as elites “democráticas” aliam-se à big tech para obliterar toda e qualquer ilusão de liberdade de expressão e informação, construindo à frente dos nossos olhos uma sociedade cada vez mais fascizada.
Da Palestina ao coração do Império
Quando se diz que Gaza é o centro do mundo, esta não é meramente uma figura de estilo. É em Gaza que está o epicentro da batalha que vai definir o curso da História, e que vai afectar as vidas de todos e todas nós – de mais formas do que as que podemos imaginar. Aquilo que é hoje normalizado em Gaza, será amanhã replicado noutras geografias e contextos – aliás, já é.
A automatização e inteligência artificial, tal como está a ser usada para vigiar e assassinar palestinianos na Palestina ocupada, está já a ser activamente usada para silenciar as vozes incómodas também aqui, no coração do Império.
De acordo com informação obtida pela Drop Site News, 90 mil publicações removidas a pedido do governo israelita demoraram em média 30 segundos a ser removidas. Mais uma vez, os paralelismos com Gaza são impossíveis de ignorar.
Em Abril de 2024, um artigo da revista israelita +972 revelou detalhes até então desconhecidos da Lavender, uma inteligência artificial usada pelas IDF para gerar automaticamente alvos durante o genocídio em Gaza.
Uma fonte afirmou que o pessoal humano muitas vezes servia apenas como um «carimbo» para as decisões da máquina, acrescentando que, normalmente, dedicavam pessoalmente apenas cerca de «20 segundos» a cada alvo antes de autorizar um bombardeamento.
+972 Magazine, Abril de 2024
Alternativas à podridão do Instagram
Para projectos de informação independente, especialmente para os que têm uma abordagem anti-imperialista, estar no instagram é combater no terreno do inimigo, sujeitos às suas regras e às suas decisões. E, de cada vez que uma página de um projecto como o nosso é apagada, todo o trabalho jornalístico publicado é erradicado da web – tal como fizeram a Saleh Al-Jafarawi e a tantos outros jornalistas palestinianos.
Quando recorremos da decisão e preparámos uma nova página (que serve agora como backup), não o fizemos por qualquer apreço por esta plataforma. E não é só devido ao algoritmo e à censura massificada, o instagram é podre do início ao fim – centra a imagem e não a palavra, não permite hiperligações para fontes ou artigos e tem um sistema de busca impossível de navegar. O instagram converte-nos em espectadores que consomem passivamente publicações triadas por um algoritmo desenhado para servir os interesses das elites.
Foi por tudo isso que, anos antes de perdermos a nossa página de Facebook com 30 mil seguidores, decidimos lançar este site que, à partida, está mais imune a tentativas de silenciamento e apagamento.
Quanto a alternativas a estas plataformas subservientes aos interesses do Império, é no Telegram que há vários anos investimos os nossos esforços e onde nos podem ler diariamente – sem termos de nos submeter a autocensura para evitar situações destas.
O recurso e a devolução
Há umas horas, recorremos da decisão de remoção da página da Guilhotina; minutos depois, a página voltou para o ar – sem que a Meta apresentasse qualquer explicação. A conclusão parece ser positiva, mas há várias coisas preocupantes.
No processo de preparação do recurso, perguntámo-nos qual seria o limite de caracteres que nos seria concedido para expor os nossos argumentos. Quando chegou o momento de submeter o recurso, a Meta não nos deu hipótese de apresentarmos qualquer argumentação – por curta que fosse. O “recurso” foi um simples clicar num botão.
O restauro da página veio minutos depois, acompanhado de uma mensagem automática. Tudo indica que esta decisão foi, também ela, fruto de um processo automatizado – e nada nos garante que, amanhã, outro processo automatizado não volte a mandar abaixo a página, desta vez de forma definitiva.
A conclusão é simples: a Meta não assegura qualquer análise ou arbitragem imparcial destes processos de censura, executando punições sumárias sobre “violações dos padrões da comunidade” – e retirando-as – de forma completamente arbitrária.
Violações, luta armada e legalidade
As nossas supostas “múltiplas violações” dos padrões da comunidade da Meta resumem-se a expressões de apoio às organizações da resistência palestiniana, ou à simples partilha de vídeos em que aparecem combatentes das Qassam. Entendemos que algumas destas publicações podem, efectivamente, violar esses “padrões da comunidade da Meta” – mas queremos reiterar que todas elas estão em linha com o direito internacional.
Enquanto algumas dezenas de países ocidentais e seus aliados consideram o Hamas e outros grupos palestinianos como “organizações terroristas”, mais de 150 países vêem-nos como legítimos actores políticos da sociedade palestiniana. Também nós partilhamos a opinião da maioria do mundo.
Além disso, o direito destes grupos a existir e resistir está consagrado no direito internacional. O Protocolo Adicional I (1977) à Convenção de Genebra afirma que «lutar contra a dominação colonial e a ocupação estrangeira» é um «exercício do direito à autodeterminação». Em 1982, a resolução 37/43 da AG da ONU reafirmou «a legitimidade da luta de um povo pela independência, integridade territorial, unidade nacional e libertação de uma dominação colonial ou estrangeira por todos os meios disponíveis, incluindo a luta armada».
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