Revisões, sanções e embargos: notas sobre as ditas “boas notícias”~ 19 min

Por F
No início da semana passada, jornais, telejornais e redes sociais encheram-se de manchetes sonantes sobre uma série de aparentes boas notícias – o Reino Unido anunciou “sanções” e “a suspensão das negociações do acordo de comércio livre” com o regime sionista, a UE falou de uma “revisão do Acordo de Associação UE-israel” e o parlamento espanhol “aprovou um embargo armas”.
As manchetes soaram bem, mas trouxeram somente uma mão cheia de nada. Uma semana depois, nada mudou – as armas continuam a fluir para o regime sionista, os acordos e tratados continuam todos em vigor, o comércio permanece inalterado e as embaixadas israelitas continuam a operar normalmente.
Na era das redes sociais, do scroll e do attention span de 5 segundos, as notícias que se sucedem num fluxo ininterrupto são desenhadas para nos incutir ora terror, ora desesperança, ora ilusão de que a mudança talvez um dia chegue dos mesmos líderes que, há 19 meses, negam estar em curso um genocídio a que o mundo assiste em directo.
Convidamo-vos então a uma viagem pela (trágica) realidade por detrás das manchetes que nos sugerem que os líderes ocidentais acordaram um dia e, ao ver a enésima imagem de uma criança esquelética e esfomeada, subitamente ganharam um sentido de moralidade, humanismo e sensibilidade.
Reino Unido: sanções e suspensão de negociações
Keir Starmer anunciou na terça-feira a suspensão das negociações do Acordo de Livre Comércio com israel. Soa bem, mas nenhum campo das relações entre os dois estados é afectado – este acordo só está previsto entrar em vigor em 2030. O actual acordo comercial entre os dois estados continua em vigor inalterado.
Starmer anunciou também sanções contra três colonos israelitas, dois postos avançados e duas “organizações extremistas” que apoiam a utilização de violência contra a população palestiniana da Cisjordânia. Mais uma vez, são decisões que fazem boas manchetes para expurgar o regime britânico da sua responsabilidade pela ocupação da Palestina e pelo genocídio em curso em Gaza. No entanto, não afectam de forma alguma a capacidade do regime sionista de matar à fome a população de Gaza nem de continuar a ocupação da Cisjordânia – onde há mais de 700 mil colonos, 114 colonatos e 196 postos avançados.
Para além disso, mesmo após estes anúncios, o Reino Unido continua a levar a cabo os seus voos militares diários sobre Gaza e a Palestina ocupada, durante os quais recolhe inteligência para o regime sionista. Os voos saem da base aérea de Akrotiri, no Chipre – uma das duas bases britânicas em território cipriota, num total de quase 250 km2 que o Reino Unido considera seus “territórios soberanos” e que continuam sob administração britânica até hoje, sob controlo directo do Ministério da Defesa em Londres.
A UE e o Acordo de Associação
Na terça-feira da semana passada voltaram também a circular notícias sobre uma possível revisão do Acordo de Associação UE-israel, que rege as relações diplomáticas e comerciais entre o regime sionista e o bloco europeu. A ideia, no entanto, não é nova – a proposta foi feita pela Holanda há mais de três semanas e ganhou nova atenção quando 9 países, incluindo Portugal, apoiaram publicamente a proposta.
Durante uma reunião do Conselho de Negócios Estrangeiros da UE realizada nessa terça-feira, os ministros dos negócios estrangeiros dos estados membros discutiram a proposta holandesa, que recebeu o apoio de 17 dos 27 governos europeus.
Após a reunião, a chefe da política externa da UE, Kaja Kallas, anunciou que o bloco vai examinar se israel violou as suas obrigações perante o Artigo 2.º do acordo de associação, que estabelece que as relações entre as duas partes «são baseadas no respeito pelos direitos humanos e os princípios democráticos» – sim, depois de 19 meses de genocídio, as instituições europeias ainda têm de analisar se israel está ou não a violar direitos humanos.
A proposta, no entanto, contou com a oposição de 9 estados membros, incluindo Itália, Alemanha, Grécia e Hungria. O Conselho de Negócios Estrangeiros da UE decide por unanimidade e, mesmo que Kaja Kallas conclua que o regime sionista está a violar direitos humanos, qualquer decisão final pode ser chumbada por qualquer um destes estados – especialmente por uma potência como a Alemanha, conhecida pelo seu histórico e determinado apoio a projectos genocidas.
Note-se também que se fala sempre de “suspensão” ou “revisão” do Acordo de Associação UE-israel, nunca do seu cancelamento.
A Suécia e as sanções
Como muitos governos querem atenção e manchetes que criem a ilusão de que estão a fazer alguma coisa por Gaza, a Suécia também fez um anúncio esta terça-feira: vai pressionar a UE para impor sanções contra alguns ministros israelitas.
No mesmo dia em que uma sondagem na televisão israelita mostrou uma oposição da maioria da sociedade israelita à entrada de ajuda humanitária em Gaza, a Ministra dos Negócios Estrangeiros sueca anunciou que deviam ser impostas sanções contra «certos ministros israelitas» que defendem «a política de colonatos ilegais» e se opõem à «solução de dois estados» – um cenário rejeitado por todo o espectro político sionista, como se viu numa votação no Knesset no Verão passado, em que apenas 9 dos 120 deputados votaram contra uma resolução que rejeita a possibilidade de vir a ser estabelecido um estado palestiniano.
Para que ninguém ficasse com dúvidas, entre as lágrimas de crocodilo pelas crianças de Gaza, a ministra fez questão de deixar claro que a Suécia é «amiga de israel».
As declarações dos ministros
Algo útil para compreender a realidade detrás das manchetes sonantes é ir ver o que disseram exactamente os protagonistas dessas notícias.
Há três semanas, após a Holanda anunciar pela primeira vez a sua proposta de fazer uma revisão ao Acordo de Associação UE-israel, o ministro dos negócios estrangeiros holandês afirmou ao Guardian que a fome imposta sobre o povo de Gaza é «contra o direito internacional», «moralmente errada» e «perigosa» – acrescentando que não acha «ser no interesse de israel».
No final das suas declarações, para quem ainda duvidasse que a Holanda está mais preocupada com os interesses do regime sionista do que com as crianças de Gaza, Caspar Veldkamp volta a deixar claro que «digo isto como alguém que se sente próximo de israel, e como antigo embaixador – esta não é uma política sustentável para israel», e reserva algumas palavras para a resistência palestiniana:
O Hamas tem de libertar os reféns o mais rapidamente possível. O Hamas tem de depor as armas. O Hamas não pode fazer parte da futura governação da Faixa de Gaza (…)
Não tenho ilusões de que o Hamas alguma vez aplique o direito internacional humanitário, mas numa democracia como israel, as democracias lutam de forma diferente e israel tem de respeitar o direito internacional humanitário (…)
Caspar Veldkamp em declarações ao Guardian
Veldkamp não só se preocupa com os interesses de israel, como repete as exigências israelitas enquanto os media o apresentam como um humanitário preocupado com as crianças a morrer à fome em Gaza.
França é outro dos estados que já vem defendendo a revisão deste acordo há pelo menos duas semanas, e Macron tem repetido com frequência a promessa de reconhecer um estado palestiniano que não existe. No entanto, antes da reunião de ministros dos negócios estrangeiros europeus desta terça-feira, o ministro francês afirmou que «as imagens que chegam de Gaza» obrigam a tomar medidas, mas que «nem israel nem a União Europeia têm interesse em terminar este acordo».
Também na terça-feira, Keir Starmer, Emmanuel Macron e o primeiro-ministro canadiano Mark Carney publicaram um comunicado conjunto em que afirmam que «o nível de sofrimento humano em Gaza é intolerável» e que o bloqueio à ajuda humanitária «é inaceitável e arrisca violar o direito internacional humanitário» (sim, «arrisca»). No entanto, mais uma vez, deixam claro de que lado estão: «Sempre apoiámos o direito de israel se defender contra o terrorismo, mas esta escalada é completamente desproporcional».
Estas declarações mostram que, por trás das manchetes, os líderes ocidentais continuam comprometidos com a ocupação da Palestina e o sistema colonial de apartheid israelita. Repare-se como todos estes anúncios e posições não colocam como exigências centrais um cessar-fogo e o fim do genocídio, mas apenas a entrada de ajuda humanitária.
Cúmplices do genocídio, ontem, hoje e amanhã
19 meses depois, para os líderes ocidentais, o problema não é o genocídio em si, como não foi a invasão de Rafah nem o cerco total do Norte de Gaza no final do ano passado, quando tentavam implementar o infâme “Plano do General” – mas a percepção do público da sua responsabilidade pelas imagens que nos chegam de Gaza. Para tentar gerir essa percepção, proferem discursos vazios, prontamente traduzidos pelos media em manchetes sonantes, mas que nunca se traduzem em acções concretas.


A União Europeia é o maior parceiro comercial do regime sionista – em 2024, 34% das importações israelitas vieram da União Europeia, e a UE foi o destino de 29% das suas exportações. 2024, esse ano em que o regime sionista bombardeou hospitais, ambulâncias, escolas, abrigos e campos de refugiados – e violou todas as normas possíveis do direito internacional.
O Reino de Espanha e os embargos
A suposta “boa notícia” mais significativa da passada terça-feira foi a aprovação, no parlamento espanhol, de um voto que supostamente diz respeito a um embargo a israel. Mais uma vez, a realidade é mais complexa.
A votação, ganha por uma pequena margem, introduz alterações à Lei 53/2007 e abre portas a embargos militares totais a estados investigados por genocídio ou crimes de guerra – uma possibilidade que as legislações europeia e nacional já prevêem, e que não é aplicada por falta de vontade política.
O governo espanhol anunciou pela primeira vez um embargo ao transporte de armamento para israel em Maio de 2024, quando o movimento pela Palestina estava num ponto alto e estudantes acampavam em várias universidades. Uma investigação publicada 6 meses depois, em Novembro, revelou que o porto de Algeciras continuava a ser um dos pontos-chave da rota do armamento operada pela Maersk.
Após a publicação dessa investigação, o governo fez novas promessas de que “agora é que vai ser a sério”.
Há 3 meses, em Fevereiro, uma nova investigação revelou que uma rota norte-americana de transporte de armamento para israel continuava a operar através do aeroporto de Zaragoza.
O momento da votação no parlamento espanhol, e as manchetes sonantes publicadas em seguida, coincidem com o regresso dos acampamentos pela Palestina a universidades em Madrid e Barcelona e com um momento de choque colectivo com as imagens de bebés escanzelados que chegam de Gaza. Provavelmente, tudo isto terá mais que ver com o controlo da reacção do público à cumplicidade com o Holocausto que se desenrola à frente dos nossos olhos, do que com uma mudança real nas políticas do Reino de Espanha.
As palavras são bonitas, mas as armas continuam a fluir
Nada disto é novo. Em Setembro de 2024, pouco depois de ter tomado posse como líder do novo executivo britânico, Keir Starmer anunciou que o Reino Unido ia suspender 30 licenças de exportações de armas para israel – de um total de 350.
Uma investigação conjunta do Palestinian Youth Movement, da Progressive International e dos Workers for a Free Palestine, publicada no início deste mês, revelou que o Reino Unido enviou «8.630 unidades de munições desde que a suspensão entrou em vigor, todas na categoria “Bombas, Granadas, Torpedos, Minas, Mísseis e Munições de Guerra Semelhantes”».
Apesar de o [Ministro dos Negócios Estrangeiros] David Lammy (…) e outros ministros reiterarem repetidamente (…) que o governo pôs fim ao fornecimento directo de peças para os F-35, as provas indicam que este continuou a enviar para israel carregamentos de componentes para os F-35 depois de Setembro de 2024 – e que estes envios continuam até hoje.
Fonte: Al Jazeera
E não são só as grandes potências ocidentais, cuja cumplicidade está à frente dos olhos de toda a gente – os estados com posições aparentemente mais “pró-Palestina” também o fazem.
Um dia depois de todos estes pomposos anúncios, Ione Belarra, deputada e secretária-geral do Podemos, expôs as contradições do executivo espanhol numa intervenção implacável no parlamento espanhol, dirigida ao Ministro do Interior do governo de Pedro Sánchez:
«Senhor Marlaska, você comparece hoje perante o Congreso de los Diputados devido a um contrato de 6 milhões de euros em balas que os senhores concederam a uma empresa israelita, Guardian Homeland Security, já em Outubro do ano passado, quando já então tinham dito que iam cancelá-lo. Em plena Semana Santa, enteirámo-nos de que não só não tinham cancelado o contrato, como a tramitação tinha continuado com total normalidade até à adjudicação definitiva do contrato já em pleno Abril.
O que eu queria saber é como é que hoje podemos acreditar que vão cancelar este contrato se já mentiram da primeira vez. (…)
Os senhores não continuaram só a comprar e a vender armas ao estado terrorista de israel depois do 7 de Outubro. Como denuncia o Centro Delás, as conexões armamentistas [do estado espanhol] com o estado de israel estão mais vivas, são mais abundantes e mais lucrativas do que nunca. (…) Nunca antes tantas empresas espanholas ou com sede [no estado espanhol] tinham desenvolvido tantos projectos conjuntos com empresas israelitas, e nunca antes a indústria israelita tinha conseguido a adjudicação de tantos contratos do ministério de defesa espanhol. (…) Mais de mil milhões de euros de contratos de armamento celebrados pelo governo espanhol com empresas israelitas – dinheiro dos nossos impostos (…)
Dá-me um autêntico nojo que se esteja a usar o esfoço da gente trabalhadoras deste país, que é solidária com a Palestina, para financiar um genocídio. Os senhores ontem votaram a favor do embargo de armas, e hoje continuam a comprar, a vender e a permitir o trânsito de armas com destino a israel. (…)
Hoje mesmo, o governo (…) podia convocar um conselho de ministros extraordinário e decidir um embargo de armas formal através de um Decreto Real (…). Mas o que procuram é a manchete, é ficar bem na fotografia, parecendo que apoiam o povo da Palestina quando não fazem o que têm de fazer.
Ninguém nos vai salvar
Se é isto que faz o governo do Estado Espanhol, um dos estados europeus que tem tido posições mais “arrojadas” – tendo reconhecido oficialmente o estado da Palestina e anunciado (várias vezes) proibições à utilização do seu território para transportar armas para o regime sionisa (sem nunca as aplicar) –, o que esperar dos restantes estados? Nem no Sul Global, na grande maioria dos casos, as palavras se traduzem em acções concretas.
Veja-se o caso de África do Sul, um estado com uma posição histórica de apoio à libertação do povo palestiniano e que apresentou a acusação de genocídio perante o Tribunal Internacional de Justiça (TIJ). Até 2024, a África do Sul era o terceiro maior exportador de carvão para o regime sionista, depois da Rússia e da Colômbia. Era deste país sul-americano que vinha a maioria do carvão importado por Tel Aviv até Gustavo Petro proibir estas exportações em Julho do ano passado.
A África do Sul, para compensar, aumentou as suas exportações – o volume do carvão enviado para o regime sionista aumentou em 17% entre Janeiro de 2024 e Janeiro de 2025. O total das exportações sul-africanas (incluindo outros produtos) aumentou 22,9% no mesmo período, chegando aos 28 milhões de dólares – um crescimento que se manteve mais ou menos constante durante os últimos 5 anos.
O complexo sistema de inteligências artificiais e sistemas de vigilância que controlam cada momento da vida (e da morte) dos palestinianos em Gaza requer uma grande quantidade de electricidade para funcionar – e é para isso que o carvão sul-africano é usado, com pleno conhecimento de todas as partes.
Ao fim de 19 meses de genocídio em Gaza, parece mais seguro do que nunca afirmar que nenhum governo nem nenhuma organização internacional vai salvar Gaza, tal como ninguém nos vai salvar a nós.
Intervenção militar e Marcha para Gaza
Se há alguém que pode salvar Gaza somos nós, as pessoas comuns, e as organizações solidárias com a Palestina – se estivermos dispostas a escalar as nossas acções e a fazer coisas que ainda não foram feitas, pelo menos por cá.
Nos últimos meses surgiram duas iniciativas nesse sentido, mas que pecam por não compreender estas realidades.
A primeira pede uma coligação intenacional que leve a cabo uma intervenção millitar para pôr fim ao genocídio em curso. O pedido é dirigido ao Grupo de Haia, um grupo de nações do Sul Global criado para proteger e fazer cumprir as decisões do TIJ e do TPI. Dele fazem parte Belize, Bolívia, Cuba, Colômbia, Honduras, Malásia, Namíbia, Senegal e África do Sul.
A ideia de uma intervenção militar internacional não é descabida – pelo contrário, se houvesse algum bom-senso no sistema internacional, era algo que já teria acontecido há muito – mas está profundamente desconectada da realidade. Se, ao fim de 19 meses de genocídio, a maioria destes países continua a manter relações diplomáticas e comerciais com o regime sionista, continua a deixar soldados genocidas passar férias nos seus territórios, como podemos esperar que os seus governos decidam lançar uma intervenção militar para salvar Gaza?
As contradições estão também no próprio seio da solidariedade com a Palestina – enquanto pedimos a este ou aquele governo para escalar as suas acções em defesa da Palestina, a maioria dos movimentos e pessoas solidárias não está disposta a escalar as suas acções – seja por dogmas ideológicos (como o pacifismo) seja por medo das consequências.
A outra iniciativa é a Marcha para Gaza, que envolve activistas de mais de 30 países e pretende chegar ao lado egípcio de Rafah a 15 de Junho. Mais uma vez, a ideia é boa – e, se peca por algo, é por ser tardia. No entanto, é difícil imaginar que mudanças vai conseguir além de reportagens nas redes sociais e, com sorte, nos media, de mais sensibilização e de expôr a barbárie sionista.
A verdade é que a barbárie está mais que exposta para toda a gente ver, e o mundo já não precisa de sensibilização, precisa de acção.
As centenas de pessoas que vão entregar o seu tempo e os seus recursos para ir até Rafah podiam estar nos seus territórios a usar esse tempo e esses recursos para bloquear ou atacar ministérios, bancos que lucram com o genocídio, empresas cúmplices e outros símbolos do imperialismo ocidental.
Sim, são acções que não dão likes nem fazem as nossas caras aparecer em vídeos no instagram, e que podem dar direito a processos judiciais e até a penas de prisão – mas que certamente fariam muito mais para forçar os nossos governantes a pensar duas vezes em continuar a apoiar genocidas.
O propósito da manipulação
Não é por acaso que todas estas manchetes surgiram num momento absolutamente catastrófico para a população em Gaza e para quem assiste todos os dias a este pesadelo. O objectivo deste espectáculo, e da campanha mediática que o acompanhou, foi popular os nossos feeds de manchetes que nos dão a ilusão de que finalmente os nossos governos estão a começar a ouvir-nos – de que, talvez com mais uma ou outra petição, mais um ou outro protesto pacífico e ordeiro, mais uma ou outra campanha internacional, a coisa se vai resolver.
Uma ilusão que, justamente quando sentimos aquele nó na garganta a começar a sufocar-nos, nos faz relaxar – e, ainda que apenas parcial ou momentaneamente, dissipa o sentido de urgência.
Esta é outra frente da guerra travada pelo Império – uma batalha pelo controlo da percepção que o público ocidental tem dos acontecimentos.
O Holocausto dos nossos tempos só pode ser travado por uma escalada da solidariedade com a Palestina, pela imposição de custos materiais sobre as empresas e as instituições que participam e lucram com o genocídio em Gaza e a ocupação da Palestina, pelo romper da normalidade e pelo bloqueio da economia e da burocracia que faz toda esta máquina funcionar – a mesma máquina que nos destrói a saúde pública e a educação, nos nega a possibilidade de aceder a casas decentes e nos põe uns contra os outros enquanto nos condena a todos a uma vida de miséria.
A resistência é o único caminho.