Os 48 anos do 25 de Abril e a grande sardinhada à integralismo lusitano~ 6 min

Por Guilhotina.info

O que é que têm em comum Marcelo, Ramalho Eanes, Vasco Lourenço, o Cardeal Patriarca, o comandante-geral da GNR, Manuel Magina (antigo chefe do corpo de intervenção na altura das manifs contra a Troika e actual Director Nacional da PSP), todos os partidos de direita e o partido socialista, presentes hoje nas comemorações oficiais do 25 de Abril?

A hipocrisia de comemorar a Revolução dos Cravos com o 25 de Novembro no coração. Esse golpe que ditou o fim do Processo Revolucionário em Curso é afinal uma data que deve ser celebrada como um dia “da democracia”, um clamor ao qual se juntou recentemente a “socialista” Ana Gomes.

As comemorações oficiais do 25 de Abril são, a cada ano, uma palhaçada maior. A participação de um partido de extrema-direita que se apropriou do lema salazarista “Deus, Pátria e Família” seria particularmente chocante, não fosse já terem sido incluídas em anteriores comemorações figuras como o general Spínola, recentemente condecorado por Marcelo juntamente com outros elementos da Junta de Salvação Nacional, e oferecidas promoções a carrascos da democracia e do poder popular, como Jaime Neves, promovido a major-general em Abril de 2009.

48 anos depois, o fascismo goza de um contexto cada vez mais favorável. A paz, o pão, a habitação, a saúde e a educação, essas, continuam por cumprir.

25 de Abril sempre, Slava Ukraini!

Da esquerda à direita, fazem-se comparações absurdas entre o 25 de Abril e a Guerra na Ucrânia. Vem-se acusando o PCP de defender o fascismo de Vladimir Putin, “o novo Hitler”, mas são os auto-proclamados democratas que andam a gritar slogans fascistas e a promover uma narrativa que legitima a via militarista.

Nos dias que antecederam o 25 de Abril, descobrimos que Zelensky, uma personagem criada pelo poder dos media, com várias figuras no seu círculo próximo com ligações à extrema-direita, envolvido em altos esquemas de corrupção, é afinal um democrata respeitável e que “os valores que a Ucrânia defende na Europa são os valores de Abril”. Bravo, Rui Tavares!

A Rússia tem de ser julgada por todos os crimes de guerra, os que cometeu e os que não cometeu, mas o Ocidente continua tranquilito da vida enquanto o Assange está à beira de ser extraditado para os States para ser julgado por expôr as ingerências, os crimes de guerra e as violações do direito internacional cometidas pelos EUA, os líderes do mundo livre e democrático, com a cumplicidade (quando não colaboração directa) do resto do Ocidente. Foi esta mesma classe política, auto-proclamada herdeira dos valores de Abril e que anda orgulhosamente de cravo ao peito um dia por ano, que esteve toda contente ao lado de Bush e Blair na Cimeira das Lajes, pronta a ser o cãozinho obediente do imperialismo ocidental e viabilizar a “operação militar especial” no Iraque, contra o malvadão Saddam e as suas armas de destruição maciça, que por acaso nunca foram encontradas.

Denunciar crimes de guerra é bué fixe, mas só quando são crimes dos eternos inimigos do Ocidente. Se vieres denunciar os nossos crimes de guerra, pagos com o dinheiro de todos nós, encerramos-te nuns calabouços onde ninguém te ouça ou se lembre de ti. Tudo em nome da democracia e da liberdade, claro. 

Então sobre a longa lista de crimes de guerra e violações do direito internacional pelas forças ucranianas durante a Guerra do Donbass, extensamente compiladas em relatórios da ONU, Human Rights Watch, Amnistia Internacional e OCDE, nem uma palavra.

Imaginemos o absurdo de, aquando da invasão do Afeganistão pelos EUA e os seus compinchas, todas as pessoas e organizações críticas do regime Taliban serem acusadas de legitimar a agressão imperialista e apoiar George W. Bush. Pela lógica que hoje impera, descobrimos que devíamos todos ter apoiado incondicionalmente os Taliban, ou Saddam,  porque as mortes civis, os crimes de guerra, as violações do direito internacional e o imperialismo são intoleráveis, e os estados têm direito a escolher os seus alinhamentos internacionais sem qualquer tipo de coerção.

48 anos depois, a “democracia” e a “liberdade” já não são mais do que palavras vazias. Entre as incontáveis diarreias verbais que se puderam ouvir hoje no Parlamento, terminamos com umas palavras de Bernardo Blanco, da Iniciativa Liberal:

“Como Abril nos demonstrou e a guerra na Ucrânia nos confirma, a democracia é difícil de conquistar, mas fácil de perder”, disse, considerando que “todas as pessoas livres – onde quer que vivam – são cidadãos da Ucrânia”.

Pena que estes senhores não estivessem preocupados com os cidadãos da Ucrânia quando, depois do golpe de 2014 patrocinado pelo Ocidente, estes foram sujeitos a um clima brutal de violência política contra tudo o que não grita Slava Ukraini, sejam pró-russos, sindicalistas, anti-fascistas, anarquistas, comunistas, comunidade LGBT, jornalistas, ciganos, e por aí fora, com a extrema-direita a gozar de total impunidade. Com o silêncio e a cumplicidade do Ocidente.

Neste momento em que os mass media, de um lado e de outro, foram totalmente transformados em agressivas máquinas de propaganda, abordaremos todos estes temas (e alguns outros) numa investigação jornalística sobre a História recente da Ucrânia, que publicaremos nos próximos dias.

Manifestação do 25 de Abril promovida pela Iniciativa Liberal, com a presença da embaixadora da Ucrânia e da Associação dos Ucranianos em Portugal. Ouviram-se palavras de ordem como “Liberdade sem censura, comunismo é ditadura”, “A rua é do povo, não é de Moscovo” e “25 de Abril sempre, comunismo nunca mais”. [1, 2] Não podia faltar, claro, o Slava Ukraini [1, 2] – e nada combina mais com a data em que se celebra o fim da ditadura salazarista do que um bom slogan nacionalista com origem em forças ucranianas colaboracionistas com a Alemanha nazi durante a 2ª Guerra Mundial.

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